Esta semana, Paolo Ardoino, CEO da Tether, participou numa conversa aprofundada com Anthony Pompliano, empresário norte-americano e fundador e CEO da Professional Capital Management. O debate centrou-se na estratégia da Tether para expandir no mercado dos EUA, no seu projeto para lançar uma stablecoin domiciliada em território norte-americano, e abordou ainda temas como inteligência artificial, ouro e interfaces cérebro-computador. Ardoino fez também um alerta sobre os riscos das empresas de tesouraria de Bitcoin excessivamente alavancadas.

Principais pontos a reter:

Quais são os planos da Tether para os EUA?

Paolo Ardoino: O recente “Genius Act” impulsiona a Tether a explorar novas oportunidades nos Estados Unidos e garantiu igualdade de condições para todas as instituições financeiras. A Tether detém atualmente mais de 127 mil milhões de dólares em obrigações do Tesouro dos EUA, tendo ultrapassado, há pouco tempo, a Coreia do Sul, o que faz com que seja atualmente o 18.º maior detentor mundial. Até ao final do ano, é possível que ultrapassemos mais um país. Isto é notável para uma empresa privada, especialmente quando comparada com Estados soberanos, mas é a realidade. Podemos vir a ser um dos aliados mais sólidos da América. A Tether planeia lançar uma stablecoin domiciliada nos EUA. Quando tal acontecer, bancos e instituições financeiras norte-americanos poderão colaborar com a Tether e tirar partido da nossa rede global para conquistar novos clientes e gerar novas fontes de receita.

Para contextualizar, a eficiência da infraestrutura financeira na Nigéria situa-se entre 10% e 20%, enquanto nos EUA ronda os 90%—um nível praticamente perfeito. Se a Nigéria conseguir aumentar para 50%, os EUA só poderão passar de 90% para 95%. Como a população sem acesso à banca nos EUA é reduzida, o produto da Tether orientado para este mercado terá de apresentar funcionalidades diferenciadoras.

Em que consiste a diferença entre o USDT e a stablecoin norte-americana da Tether?

Paolo Ardoino: O USDT é pensado, sobretudo, para mercados emergentes como a América Latina, África e Sudeste Asiático, permitindo aos utilizadores contornar sistemas financeiros pouco eficientes—funcionando, de certa forma, como uma stablecoin internacional. No entanto, nem sempre o USDT é adequado ao mercado dos EUA.

A stablecoin dos EUA foi concebida especificamente para este mercado, apresentando funcionalidades ajustadas ao sistema financeiro americano, como integração avançada com parceiros bancários e maior eficiência nos pagamentos.

Nos próximos anos, poderão surgir centenas de stablecoins nos Estados Unidos. A capacidade de migrar entre diferentes stablecoins com total fluidez será essencial, e é precisamente na experiência do utilizador e na rede de distribuição global que a Tether se distingue.

Onde pode a infraestrutura de stablecoins e blockchain melhorar ou inovar?

Paolo Ardoino: Hoje, a experiência do utilizador é o maior entrave. É necessário dispor de uma carteira, e esta tem de ter saldo para taxas de rede ao enviar stablecoins. Mesmo com soluções como abstração de contas, ainda não é possível liquidar taxas de Gas com um ativo de valor estável—continuamos dependentes de ativos voláteis como o ETH. É uma área crítica onde é preciso evoluir.

Os negociadores de matérias-primas estão a adotar stablecoins em larga escala, reconhecendo o seu contributo para a eficiência e rentabilidade dos portfólios. O Genius Act deverá acelerar a adoção institucional. As blockchains especializadas em stablecoins e liquidação—sobretudo para transações interbancárias e empresa-a-empresa—têm potencial para obter vantagens relevantes.

Tether + Inteligência Artificial

Paolo Ardoino: O QVAC é um dos projetos que mais me entusiasma. O objetivo passa por desenvolver uma plataforma nativa de inferência e afinação de IA, funcional em todo o tipo de dispositivos: desde integrados a smartphones, portáteis ou servidores. Entre os equipamentos possíveis estão interfaces cérebro-computador, automóveis, drones, robôs e até bases espaciais em outros planetas.

Defendo que a IA deve ser leve, precisa, modular e altamente adaptada ao contexto local. Nos próximos 20, 30, ou até 100 ou 10.000 anos, o potencial da IA será parte integrante da estrutura do universo. Em cinco anos, as GPUs móveis poderão ser dez vezes mais potentes do que hoje. Ambicionamos criar a primeira plataforma de IA descentralizada e imparável no mundo.

Pretendemos simular o funcionamento cerebral, construir centros de dados ilimitados e hiper-eficientes. O QVAC permite que qualquer pessoa crie modelos locais pequenos e eficientes. Recorrendo a tecnologia de comunicação peer-to-peer, todos estes modelos podem estar ligados entre si, sem servidor central, facilitando pesquisas distribuídas e respostas ótimas.

A Tether irá, eventualmente, desenvolver os seus próprios modelos base, mas o foco primordial é criar uma plataforma compatível com qualquer modelo, local ou remoto. A inferência local é chave, bem como a pesquisa na área da inferência federada peer-to-peer.

Qual é a sua perspetiva sobre ouro e Bitcoin?

Paolo Ardoino: Afirmei muitas vezes—o Bitcoin é imbatível. É perfeito. Alguns detentores veem o ouro como concorrente do Bitcoin, mas não é esse o caso. Se um investidor entende que o Bitcoin atingiu o teto e quer sair temporariamente, faz mais sentido converter para ouro do que para dólares dos Estados Unidos, porque o ouro protege melhor o poder de compra (ao passo que o dólar sofre com a inflação). No caso de um reinício financeiro global nos próximos cinco anos, com colapso das moedas fiat, a capitalização de mercado do ouro—20 biliões de dólares, largamente superior à do Bitcoin—poderá tornar-se o ativo preferido dos mercados tradicionais, enquanto o Bitcoin ainda necessita de tempo para ganhar escala.

Qual é a sua opinião sobre empresas de tesouraria de Bitcoin?

Paolo Ardoino reconhece o papel relevante destas empresas no mercado, mas mostra preocupação com estratégias demasiado agressivas, sobretudo o excesso de alavancagem. O sector acabará por passar por fases de consolidação e saneamento.

Tether + Interfaces Cérebro-Computador

Paolo Ardoino: No final de abril de 2024, a Tether investiu 200 milhões de dólares na Blackrock Neurotech. Esta empresa é líder mundial em tecnologia de interface cérebro-computador, com chips de última geração, com desempenho cem vezes superior. Está sediada no estado do Utah e trabalha com uma equipa reduzida.

A Blackrock Neurotech compromete-se a garantir que a tecnologia de interface cérebro-computador é positiva para a humanidade e permanece sob controlo humano, evitando que as máquinas nos substituam.

Como avalia a conjuntura macroeconómica atual?

Paolo Ardoino: Os Estados Unidos atravessam um momento de enorme força, e sou bastante otimista quanto ao dinamismo global dos stablecoins em dólar. As políticas aduaneiras dos EUA têm servido os seus interesses nacionais—ainda que com impactos adversos noutros países, promovem um forte crescimento económico norte-americano no curto prazo. A Europa foi pioneira na regulação dos ativos digitais, mas não capitalizou a oportunidade para aumentar o peso do euro no cenário internacional. As moedas dos países em desenvolvimento continuarão a desvalorizar-se, tornando as suas economias mais vulneráveis. No entanto, ferramentas como o USDT funcionam como Plano B, ajudando as populações locais a minorar os efeitos da volatilidade. A Tether investe não só em ouro, mas também em terrenos, agricultura, IA e projetos de interfaces cérebro-computador.

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